Vida e Morte na Pós-modernidade
No plano ontológico uma das dificuldades em abordar o tema da morte em filosofia e mesmo em Psicologia e Teologia, é que se trata do único evento na vida humana não suscetível de se transformar em experiência.
Para falar sobre a morte como para falar de qualquer tema atual, é preciso contextualizá-lo no período histórico e social em que estamos vivendo. Vivemos uma época de incertezas, das desconstruções das narrativas, da inversão de valores, do Niilismo, do imediatismo, do hedonismo, da substituição da ética pela estética, do narcisismo, do consumismo, etc.
Cientistas sociais contemporâneos, como Zygmunt Bauman, entre outros, apontam a incerteza como característica da Pós-modernidade e consideram que a predominância desse sentimento se deve à dificuldade de prever com certa margem de segurança, a amplitude e as conseqüências das ações tomadas pelo homem contemporâneo. Para esses autores, se por um lado, as inovações tecnológicas nos dão segurança e conforto, por outro trazem paradoxalmente sérios problemas, principalmente no que diz respeito à saúde e aos danos causados ao meio-ambiente. A vida perdeu seu valor, o Ter é mais importante que o Ser. O Ser só tem valor enquanto produtivo. O ser humano é desvalorizado devido à supervalorização dos bens materiais. A cultura contemporânea materialista enfatiza a personalidade centrada no EU, no individualismo. Observa-se uma valorização mercantilizada do corpo, passa-se a viver sob a regra vigente do silicone, do Botox, das cirurgias plásticas, da lipoaspiração, etc. O homem desafia e tenta driblar a velhice e a morte; porém sua principal característica é a consciência de sua finitude e a certeza de ser mortal.
Em tempos pós-modernos e em plena sociedade hipertecnológica em relação a um passado relativamente recente, vivemos alguns paradoxos: a duração da vida em número de anos se estendeu ao mesmo tempo em que a possibilidade da destruição total da vida humana é cada vez mais uma possibilidade.
O evento da morte sofre com a vida moderna, já que os rituais em torno da morte estão empobrecidos simbolicamente, sendo cada vez mais rápido esse significativo momento da vida. Em conseqüência, a morte deixa de ser um “ato social”, partilhado pela comunidade – como foi durante séculos, passando para o âmbito privado, algo a ser vivenciado solitariamente. O velório é realizado em ambiente próprio e não mais em casa, manifestações de tristeza e choro são contidas para não constranger os presentes, os cemitérios mais se parecem com jardins, o período de luto se resume a poucos dias, logo a vida da família do morto ‘volta ao normal’. A equipe de saúde procura dissimular a presença da morte impedindo que as pessoas tenham acesso ao quarto daquele que morre, procurando fazer rapidamente o preparo do corpo. Evita-se dizer que alguém morreu, usando, no lugar, a expressão, “foi a óbito”. O medo da doença, da velhice e da morte torna-se maior. Um medo a ser enfrentado a ferro e fogo. A morte é escancarada e transformada em episódio midiática, sendo mostrada em forma de espetáculo, corpos abandonados nas calçadas, jovens agredidos à paulada pelas ruas e campos de futebol, o desrespeito pela vida e pela morte, crianças são jogadas pela janela, abandonadas em latas de lixo, jovens colocando fogo em morador de rua, mata-se por um par de tênis.
A morte torna-se banalizada. O homem desperta para a consciência de sua Finitude. Da finitude que não descrimina ninguém.
A certeza da própria morte aciona mecanismos de reação para enfrentamento da Angústia diante da Finitude: é preciso resgatar a crença em Deus. A Pós-modernidade busca exatamente a reafirmação desses valores, ou seja, dos valores Transcendentais. É preciso crer em algo além da vida. Esta tendência já se faz sentir em todos os setores da vida em sociedade. Instituições se mobilizam.
A OMS - Organização Mundial de Saúde tem se preocupado em atuar no sentido de levar Instituições e profissionais a oferecer formação e treinamento específico para o Cuidado Paliativo. Universidades buscam parcerias com religiosos. Já é evidente a possibilidade de diálogo entre Ciência e Religião; Os Currículos das Faculdades de Medicina buscam incluir a Assistência Espiritual como disciplina obrigatória. A Ciência já admite a relação entre Fé e Cura.
Profa. Dra. Edna Paciência Vietta
Psicóloga Cognitivo-comportamental Ribeirão Preto